Por Fernando Lobato_Historiador
O apóstolo Paulo, em Romanos 1:20, diz assim: “Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis”. Com tais palavras, ele destaca duas dimensões diferentes, porém complementares, que Deus manifesta enquanto criador.
A primeira diz respeito a uma dimensão interna que nos é completamente invisível fisicamente, ou seja, o seu poder e divindade enquanto potencial criativo, enquanto a segunda, manifesta fisicamente na criação, é visível e plenamente acessível a nossa compreensão, de modo que, na opinião de Paulo, somos inescusáveis ou indesculpáveis quando negamos a sua existência.
No Evangelho de João (1:1-14), lemos que Deus, o verbo, se fez carne através de Jesus, ou seja, que ele, enquanto ser infinito e eterno (atemporal) , se fez finito e temporal durante a vida física de Jesus, ratificando, num exemplo bem específico, o que Paulo expressou aos romanos e, ao mesmo tempo, apontando uma das dualidades essenciais de Deus, ou seja, a sua condição simultânea de ser interior (invisível e infinito) e ser exterior (visível e finito).
Saindo do texto do Novo Testamento e adentrando no Tao Te Ching, o texto básico do Taoismo, vemos que TAO, a totalidade, se manifesta através do Yang (Princípio Ativo) e do Yin (Princípio Passivo) de forma que, a partir da interação destes, tudo ganha existência. Na filosofia Taoista, o Yang e o Yin possuem naturezas opostas e complementares, ou seja, que se equilibram harmonicamente e a tudo dão forma e sentido.
Deixando a religião de lado e adentrando no campo da Filosofia Grega, mais especificamente em Heráclito, observamos que a realidade é também pensada como dualidade: a Physis (realidade visível) como dimensão exterior e o Logos (realidade invisível) como dimensão interior, responsável pelo processo de existência e transformação de todas as coisas, ou seja, uma espécie de mente cósmica universal.
Saindo da Filosofia e adentrando o campo da Ciência, constamos um tipo de dualidade presente na estrutura básica da matéria, ou seja, a dualidade do positivo e do negativo. No átomo, espécie de tijolo do edifício universal, essa dualidade se revela através da interação de prótons (positivo) e elétrons (negativo). Interessante observar que essa interação se dá de forma harmônica e complementar tal como na relação do YANG e do YIN no taoismo.
Quando átomos interagem com outros átomos, forma-se uma estrutura mais complexa a qual damos o nome de molécula e esta se estabiliza dentro de um esquema semelhante ao do átomo, ou seja, com pleno equilíbrio e harmonia de seu elemento positivo com seu elemento negativo. Na água, por exemplo, o H2 (+2) forma um sistema eletricamente neutro com O (- 2).
No reino biológico ou dos seres vivos, como regra geral, vemos que a existência e perpetuação das especies se dá através da interação de um elemento masculino com outro feminino, ou seja, num plano maior de existência, visto que a célula é uma espécie de tijolo da vida e é composta de moléculas e átomos, observamos mais uma vez a manifestação de um modelo dual de interação.
Se a dualidade de Deus e de tudo o que ele criou, conforme vimos, pode ser demonstrada em todos os campos do conhecimento humano, cabe-nos uma questão: Qual o seu sentido? Se aceitarmos que Deus criou o universo como extensão de si mesmo e que é desse universo que ele extrai o sentido de sua própria existência, chegamos facilmente a essa resposta, ou seja, nada existe, exclusivamente, em função de si mesmo.
Nenhum ser, pelas regras que o criador imputou ao conjunto de sua obra e inclusive a si mesmo, encontra sentido apenas em si porque a felicidade, enquanto sensação, necessita de um parceiro ou objeto que lhe sirva de estímulo. De que adianta ser o homem mais rico do mundo quando não se tem com quem compartilhar dessa condição? De que adianta ser o melhor professor do mundo se não há alunos interessados no saber do mestre? Eis dois exemplos de realidade unipolar que se mostram absolutamente inúteis e o criador, ainda que seja Deus, não quis e não quer existir dessa forma.
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